A partida
de um patrimônio da arte imaterial do sertão
Hoje, o sol da reserva imaterial da poética sertaneja
está nublado, pela despedida de um guardador da arte literária. O mestre Teófanes Leandro, foi morar junto das
estrelas do Olimpo da Poesia. Durante sua
existência, foi um chiqueirador da sensibilidade; um tangedor da experiência estética;
um guardador de um tesouro feito de palavras delicadas e enternecedoras, enfim,
um sertanejo autêntico! Um grande protetor da mais representativa arte do Cariri
paraibano e do Pajeú pernambucano.
Homem de oratória eloquente e de um saber
acumulado pelas leituras e pela experiência de vida, Teófanes gostava de
receber os amantes da poesia em sua humildade casa, numa propriedade rural, no
sítio Melancia, nas ribeiras do Rio Feiticeiro da Poesia. Sempre atualizado e cortês,
o sertanejo de expressões fortes, adorava apresentar um imenso repertório de
poesias dos grandes vates do passado.
O terreiro ou a sala da sua casa era o grande
palco, onde Teófanes se transformava em poesia. Quando recebia visitas, começava a falar de
algum poeta, e em pouco tempo, uma enxurrada de versos eram declamados com
muita emoção e expressividade. Homem rústico, acostumado com a labuta do sertão,
enfrentava os espinhos afiados das juremas, mandacarus, coroa-de-frade, xiquexique,
longas estiagens, sol inclemente, entre outros desafios. O declamador e
contador de histórias, era uma pessoa delicada, amiga, educada e sempre aberta
a quem chegasse a sua humilde residência.
Com Teófanes foram embora um imenso repertório
de poesias e histórias dos poetas cantadores que habitaram o grande Estado do
Sertão. Fica na memória dos que visitavam sua casa os momentos inesquecíveis de
êxtase poético e a oralidade de um homem que viveu e soube registrar o seu
tempo. Sabedor das letras e dos acontecimentos do mundo, o contador de histórias
e guardião da alma sertaneja, era um questionador inquieto dos assuntos
religiosos, políticos, sociais, econômicos e das coisas da vida; sempre
surpreendendo os visitantes com algumas perguntas instigantes e desafiadoras. Era
uma pessoa apaixonada pelo saber.
Quebrando os grilhões dos urbanoides (designação de Elomar aos urbanos) Teófanes mostrou que o sertanejo
é um homem portador de grande sabedoria e conhecimento das coisas do mundo. Tive
o prazer de inserir na minha tese de doutorado (O sertão educa), as palavras
sensíveis de Teófanes sobre sua relação com a natureza do sertão. Este
sertanejo de alma maneira (a lá Elomar de novo), deixou o legado de uma
grande reserva antropológica, revelada por meio da arte poética, expressão máxima na estética da Terra da Poesia.
Gilmar Leite
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