
Vi somente crepúsculos ao invéis de auroras
E à velhice cheguei aos solavancos.
IV
Quando a mão com sutil delicadeza
Solta pingos de água num jardim
Cada pétala se abre dum jasmim
Num sorriso com dúlcida pureza.
Uma essência se exala com leveza
Dando beijos na mão com seu olor
Perfumando com plácido fulgor
Numa oferta divina do seu lume
"Sempre fica a presença do perfume
Entre os dedos da mão que rega a flor".
Cada dedo oferece os orvalhos
Derramados do céu da sua mão
E a flor faz surgir do coração
O presente divino dos seus galhos.
Colibris fazem vôos com atalhos
Numa pressa coberta de temor
Como lindos parceiros do amor
Beijam flores morrendo de ciúme
"Sempre fica a presença do perfume
Entre os dedos da mão que rega a flor".
A presença dos pingos cristalinos
Derramados da mão como presente
Faz a flor se abrir toda contente
Igualmente o sorriso dos meninos.
Do seu corpo surgem olores finos
Com mil beijos dum grande sedutor
Infiltrando-se nos dedos com ardor
Sem ouvir beija-flores com queixume
"Sempre fica a presença do perfume
Entre os dedos da mão que rega a flor".
Eu comparo a grandeza da verdade
Praticada através da ação humana
Quando a mão da virtude soberana
Joga os pingos divinos da bondade.
Sobre o campo da vida o amor invade
Com essências tocando o regador
Perfumando o seu gesto doador,
Onde Deus no seu peito logo assume
"Sempre fica a presença do perfume
Entre os dedos da mão que rega a flor".
Ps: Mote do poeta Xico Borges
O BUCÓLICO MUNDO DO POETA CANCÃO
Gosto da poesia de uma forma ampla e profunda, independente dos estilos literários. Mas tem 3 estilos que de certa maneira me encantam e me seduzem. São eles: O Soneto, o Galope à Beira Mar e o Decassílabo. A sonoridade e os rítmos dos estilos citados fazem minh alma bailar na sinfonia poética.
Galopes à Beira do Mar
Cheguei do sertão pra morar na cidade
Trazendo na mala os costumes da terra
O vale, a campina, a grandeza da serra,
Os sonhos brotados na flor da idade.
Andei pelas ruas buscando a verdade
Dos sonhos do povo que habita o lugar
Vi gente correndo sem nunca parar
Vivendo o pavor da cidade moderna
Saí correndo com horror da baderna
Fui dar os meus passos na beira do mar.
Pisando nas lindas areias branquinhas
Senti uma cócega sob os meus pés
Eram as correntes fazendo revés
Trazendo mil beijos das águas marinhas.
Fiquei encantado com as brisas mansinhas
Beijando o meu corpo num doce tocar...
Cantigas das ondas num lindo bailar
Chegavam à praia mostrando os encantos
Pensei minha mãe entoando acalantos
Cantando comigo na beira do mar.
Coqueiros gigantes, iguais a guerreiros,
Fincados no chão, balançando as palhas,
Morenos artistas fazendo mil talhas
Cruzando com traços os belos letreiros.
Fiquei encantado olhando os barqueiros
Num simples trabalho mostrar seu lugar
Olhei pras cabanas no meu contemplar
Vi lindas crianças nas formas singelas
Brincando nos barcos, mexendo nas velas
Fazendo castelos na beira do mar.
Sentado na praia, olhando o oceano,
Vi ondas velozes beijando as areias;
O corpo moreno de lindas sereias
Mostrando com graça seu riso arcano.
Nas águas eu vi um poder soberano
Com cores e luzes seu mundo pintar...
Fiquei abismado com seu governar
Ergui a cabeça, pensei do meu jeito,
Que quadro tão belo, que mundo perfeito,
Mostrando aquarelas da beira do mar.
Vi peixes pequenos pulando velozes
Nas cristas das ondas fazendo gracejos
O brilho do sol refletia lampejos
Tocando nas asas de mil albatrozes.
As águas chegavam com garras ferozes
Batendo nas rochas num forte ruflar
A praia mostrava o seu branquejar
Tapetes de espumas beijavam as areias
Deixando seu palco pra lindas sereias
Mostrarem encantos na beira do mar.
O sol se deitava no corpo da praia
Dourando as espumas de cor amarela
O vento dizia que a forte procela
Surgia feroz quando a lua desmaia.
As ondas que eram da cor de cambraia
Ficavam vermelhas com corpo a sangrar
Ergui a cabeça vi Vênus chegar
Jogando reflexos nas águas revoltas
Estrelas pequenas brincavam bem soltas
Jogando lampejos na beira do mar.
O mar revoltoso, por causa da noite,
Batia com fúria nos grandes rochedos,
Deixando minh’alma tremendo de medos
Por causa do forte e infindável açoite.
A lua surgia no céu pro pernoite
Abrindo o seu riso num doce pulsar...
Barqueiros poetas na luz do luar
Cantavam serestas pra suas donzelas
Na praia chagavam as fortes procelas
Mostrando cantigas na beira do mar.
O mar orgulhoso olhava pra mim,
Dizia que tinha imensos mistérios,
No fundo guardava diversos impérios,
Os quais nenhum homem sabia seu fim.
Contou-me que tinha no oculto um jardim
De plantas estranhas que podem matar,
Florestas imensas cobrindo o lugar,
Cavernas ocultas, lugares profundos,
Crustáceos e peixes de excêntricos mundos,
Latentes brincando no fundo do mar.
O dia surgiu, eu fiquei contemplando,
Segredos imensos que tem o oceano;
Sabemos tão pouco, perdemos o plano,
Em cada mergulho que a gente for dando.
Senti no meu peito minha alma agitando,
Eternas correntes que tem meu cantar;
Dei passos nas águas num brando tocar,
Levando nos ombros a minha sacola,
Fazendo improvisos ao som da viola
Cantando um galope na beira do mar.